Projeto “Serpenteando” aproxima ciência e comunidade

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Iniciativa do professor Paulo busca promover educação ambiental e mudar a percepção sobre as serpentes na região do Seridó paraibano

No Campus Santa Luzia do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), um projeto de extensão vem chamando atenção pela proposta inusitada: aproximar a comunidade da ciência e, ao mesmo tempo, combater o medo e os mitos que cercam as serpentes. O Projeto Serpenteando, coordenado pelo professor Paulo Ragner, surgiu com o propósito de desmistificar crenças populares e promover a educação ambiental por meio do conhecimento científico.

“Na academia, a gente produz muita ciência que acaba ficando restrita à universidade. Eu queria mudar isso: pegar o conhecimento que adquiri no mestrado e no doutorado e levar pra comunidade, aproximando ciência e sociedade”, explica o professor.

Formado em Biologia, com atuação na área de herpetologia, ciência que estuda anfíbios e répteis, Paulo percebeu que esses animais, especialmente as serpentes, ainda são muito negligenciados e mal compreendidos. “A gente aprende culturalmente que ‘cobra boa é cobra morta’, mas elas são essenciais para o equilíbrio ambiental e até para a medicina”, reforça.

Entre os exemplos citados pelo professor, estão medicamentos produzidos a partir de substâncias encontradas em venenos de serpentes, como o Captopril, usado no tratamento da pressão arterial, e colas cirúrgicas derivadas do veneno da cascavel, aplicadas em cirurgias como cesarianas.

“As pessoas não imaginam o quanto esses animais são importantes para a ciência e para a nossa própria saúde”, destaca Paulo.

Atualmente, o projeto conta com nove alunos do curso técnico de Informática, além do professor Leonardo Lúcio (colaborador), o técnico Leandro e o próprio coordenador. As atividades começaram há cerca de dois meses e já alcançaram diversas escolas da região, como a Escola Ana Brito e outras instituições como a Escola Ezequiel Fernandes e a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Santa Luzia).

Nas ações, os estudantes do projeto realizam oficinas, palestras e exposições. O trabalho é dividido em duas etapas: uma parte teórica, com explicações sobre as espécies e sua importância ecológica, e uma parte prática, que inclui a observação de serpentes conservadas e até o contato com exemplares vivos, todos legalizados e autorizados pelo Ibama.

“A gente mostra os materiais, os tipos de dentição, fala das serpentes peçonhentas e não peçonhentas. Depois, eles têm contato com os animais. Isso ajuda a quebrar o medo e a curiosidade exagerada”, explica o professor.

Uma pesquisa realizada com cerca de 70 alunos do ensino médio após as ações mostrou que 100% dos participantes consideraram as atividades teóricas e práticas fundamentais para desfazer mitos e medos em relação às serpentes.

“Muitos alunos perdem o medo e entendem que não se deve matar o animal, mas chamar os órgãos competentes para o resgate. Essa mudança de percepção é o que buscamos”, relata Paulo.

O professor lembra que cada espécie cumpre um papel importante no equilíbrio ambiental. “Quando se mata uma serpente, você quebra uma cadeia natural. Elas controlam populações de roedores, que transmitem doenças”, pontua.

Na região de Santa Luzia, os acidentes mais comuns envolvem jararacas, serpentes peçonhentas de interesse médico, responsáveis pela maioria das ocorrências. “A hipótese é que o desmatamento e as vibrações provocadas por atividades agrícolas façam com que elas se desloquem para áreas rurais e urbanas”, explica.

Apesar disso, a maior parte das serpentes encontradas na região não é venenosa. Espécies como a jiboia, a falsa coral e a muçurana, popularmente conhecida como “cobra preta”, são inofensivas ao ser humano e até benéficas. “A muçurana, por exemplo, se alimenta de jararacas e cascavéis”, diz o professor.

Para o próximo ano, o grupo pretende expandir as atividades para outros municípios, incluindo Patos, Pombal e Princesa Isabel, além de fortalecer parcerias com outros campi do IFPB.

“Nosso objetivo é levar a educação ambiental para mais comunidades e continuar sensibilizando as pessoas sobre a importância da preservação. Se uma pessoa deixar de matar uma serpente por causa do que aprendeu com o projeto, já valeu a pena”, conclui Paulo.

O professor reforça ainda a orientação final: “Em caso de encontro com serpentes, a população deve acionar a Polícia Ambiental, que é capacitada para o resgate e soltura segura dos animais.”

Isabella, aluna bolsista do Serpenteando, disse que o projeto a fez sair da zona de conforto e que, “o interesse pelo universo das serpentes foi tanto que ela convidou Paulo para ser seu orientador de trabalho de conclusão de curso. Também estou desenvolvendo um jogo na área técnica para apresentar às escolas, um jogo de tabuleiro no qual as crianças irão aprender sobre esses animais de forma lúdica”, disse.