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A inclusão social de pessoas com deficiência

O discurso social atualmente postula o respeito às diferenças, a valorização da diversidade, a promoção da participação de todos. Mas, em tempos em que se prega a inclusão e a não discriminação, qual será a real postura social diante de pessoas com deficiência? Há entraves à sua efetiva inclusão?
publicado: 05/12/2018 10h32 última modificação: 05/12/2018 10h32

No dia 03 de dezembro é comemorado o dia internacional da pessoa com deficiência e, nesta edição, o Fique por Dentro traz um diálogo sobre esses sujeitos, suas conquistas, as concepções em torno deles e a sua realidade atual no Brasil.

Quem são as pessoas com deficiência?

Por mais redundante que possa parecer, pessoas com deficiência são pessoas, o que implica dizer que são cingidas por toda a complexidade que caracteriza o ser humano. Sua formação psicossocial, para além de uma peculiaridade, é influenciada pelo contexto histórico, cultural, social e familiar no qual estão inseridas, em conjunto com fatores individuais, ligados à sua própria personalidade. Como qualquer pessoa, têm potencialidades e dificuldades, sentem, pensam, vivem e elaboram de maneira particular cada experiência. Apresentam, como todas as pessoas, afinidades e distinções entre si.

O que caracteriza as pessoas com deficiência?

Dentre as muitas definições que possam existir, destaca-se aqui a trazida pela Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13146/2015), que expressa, no artigo 2º:

"Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." (Brasil, 2015).

Pode-se dizer, então, que pessoas com deficiência são aquelas que apresentam diferenças físicas, sensoriais ou intelectuais, decorrentes de um processo de desenvolvimento diferenciado ou de algum incidente que resultou na diferenciação de suas características em relação às tipicamente apresentadas pela maioria das pessoas. Tais características, em interação com as condições sociais, acarretam a restrição da sua participação na sociedade.

Entretanto, a condição de deficiência não implica em impossibilidades inalteráveis que determinam para essas pessoas o destino fatal de viverem perpetuamente tuteladas por outrem, sem contribuírem ativa e efetivamente para a sociedade e sem serem protagonistas da própria história. Muitos, tendo oportunidade, trilham com sucesso a carreira acadêmica, ocupam postos de trabalho em diversas áreas, tornam-se artistas ou desportistas talentosos, compram, vendem, etc., além de constituírem família e gerenciarem a própria vida.

Para tanto, posto que essas pessoas interagem com o meio de maneiras diferenciadas, são demandadas algumas ações da sociedade, que incluem o provimento de habilitação/reabilitação e condições de acesso, participação e êxito adequadas. Essas condições dizem respeito a um vasto leque de ações, que incluem a implantação de políticas inclusivas,  a acessibilização urbanística e arquitetônica, a acessibilização nas comunicações nas diversas mídias, a oferta de materiais pedagógicos adequados e de outros materiais de tecnologia assistiva, e, ressalte-se, a formação adequada de profissionais, numa perspectiva que considere a presença dessas pessoas na sociedade, pois, se é levada em consideração, em tudo o que diz respeito à organização social, a presença natural de pessoas com características diferenciadas, pressupõe-se que será natural também o planejamento e a execução de serviços de maneira a contemplar essas diferenças e propiciar a participação de todos. Não se trata, portanto, de conceder privilégios a alguns, mas de renunciar à categorização e a inferiorização, compreendendo que as pessoas são igualmente dignas e que participam e atuam no meio através de estratégias diferentes.

Pessoas com deficiência e a heterogeneidade

Em se tratando de seres humanos, generalizações são inviáveis, sendo necessário conhecer a pessoa mesma, e também conhecer suas demandas. Para isso, devem ser mantidos diálogos com a própria pessoa, tanto quanto possível, o que não exclui o diálogo com amigos e família. Entre muito que poderia ser dito, destaca-se aqui o seguinte:

  • pessoas com deficiência não são iguais umas às outras no que se refere  às características pessoais;
  • pessoas com a mesma deficiência certamente apresentarão necessidades em comum, mas também não são completamente iguais nesse aspecto;
  • a pessoa que vive uma deficiência não domina os recursos e as estratégias próprios para inclusão de pessoas com outra deficiência, a menos que tenha aprendido a manejá-los por alguma circunstância. Assim, é comum que cegos não saibam LIBRAS e surdos não saibam Braille;
  • semelhantemente, recursos e estratégias eficazes para a inclusão de pessoas com um tipo de deficiência não funcionam para outro tipo. Cada deficiência, conforme a sua natureza, vai demandar ações, estratégias e recursos diferenciados;
  • da mesma forma, entre indivíduos com o mesmo tipo de deficiência, alguns recursos demandados serão diferenciados. Ex.: materiais de leitura em tipos ampliados não são úteis a pessoas cegas, mas sim àquelas que têm baixa visão.

 Breve panorama histórico

O entendimento acerca das pessoas com deficiência entre as sociedades primitivas oscilou entre a divinização e a inferiorização mais cruel, havendo desde sociedades que as consideravam mais sensíveis misticamente ou que as protegiam a fim de alcançar favor divino, até aquelas que as excluíam de atividades sociais ou mesmo as matavam.

Na Idade Média, eram frequentes as casas de assistência, mantidas por senhores feudais, onde essas pessoas ficavam recolhidas e deviam ser cuidadas.

Construiu-se posteriormente o entendimento de que deviam ser buscados meios de dar ocupações produtivas a esses sujeitos, sendo observada, no Renascimento, a confecção de artefatos para a sua mobilidade e trabalho.

A partir da segunda metade do século XX, parecem ser observadas as mudanças mais significativas no tocante a concepções e à luta pela inserção social de pessoas com deficiência. Além da promulgação de documentos pela ONU e por outras convenções locais, observou-se certa pressão internacional para que as nações aderissem às mudanças de perspectiva, abandonando as práticas assistencialistas, e reconhecendo os direitos fundamentais dessas pessoas. Foram sendo consolidados os pressupostos filosóficos que fundamentam o paradigma da inclusão, o qual, pode-se dizer em linhas gerais, postula que a sociedade precisa se organizar para propiciar a plena participação de todos, para o que são demandadas as condições adequadas já mencionadas.  Nesse contexto, os fóruns e documentos internacionais impulsionaram a promulgação de leis que gradativamente deslocaram das instituições especializadas para o Estado a responsabilidade pela inserção social dos cidadãos com deficiência.

Pessoas com deficiência e a legislação brasileira

Dentre as conquistas legais no Brasil, mencionam-se as seguintes:

  • Constituição Federal de 1988: prevê a não discriminação em relação à admissão ao trabalho e ao salário para pessoas com deficiência, a educação formal preferencialmente no ensino regular, o atendimento educacional especializado, a adequação de transportes públicos, entre outras disposições (cf. arts. 7º, 205, 240, entre outros).
  • LEI nº 12.711/2012: trata da reserva de vagas em processos seletivos para instituições federais de ensino médio, técnico e superior e inclui, entre os grupos que poderão ter direito às cotas, pessoas com deficiência.
  • Lei nº 13146/2015: usualmente chamada de Lei Brasileira de Inclusão (LBI) reúne vários direitos, atualizando alguns já legitimados anteriormente, em uma perspectiva que reconhece o direito de todas as pessoas à participação social e o dever do Estado em mobilizar ações para efetivá-lo. Entre os direitos previstos pela LBI, destacam-se aqui: o direito à vida; à habilitação e reabilitação; à saúde; à educação; à moradia; ao trabalho; à assistência social; à previdência social; à cultura, ao esporte, ao turismo e ao lazer; ao transporte e à mobilidade; à participação na vida pública; entre outros.

 As pessoas com deficiência no Brasil atualmente

As conquistas legitimadas na legislação brasileira e as iniciativas para a sua implementação, inegavelmente, trouxeram avanços à participação ativa das pessoas com deficiência nas diversas esferas sociais, como já mencionado. Nota-se, porém, que muitos serviços são precarizados, ao passo que outros direitos, também legitimados, sequer são efetivados. As barreiras à inclusão decorrem não apenas do caráter processual das conquistas ou das burocracias de toda ordem, mas também enraízam-se fortemente nos ecos das já vistas concepções estigmatizantes.

Este é, pois, tempo de reconhecer e celebrar as conquistas, mas, ao mesmo tempo, de prosseguir, com empenho, nas reivindicações e na proposição de iniciativas visando à concretização dos direitos já legitimados.

Finalmente, vale ressaltar que a pessoa com deficiência não deve apenas lutar por seus direitos, mas aproveitar as oportunidades e assumir as responsabilidades decorrentes de ser protagonista da sua vida.

Fique por dentro!